
Se a
vida já é difícil para comunicadores que trabalham para veículos
conhecidos, imagine os blogueiros que estão praticamente sozinhos ao
relento, contando com apoios bissextos e a sorte para não se tornarem
estatísticas de violência. A situação piora violentamente no interior do país,
onde muitos blogs se tornaram a única forma de fiscalizar os desmandos de
autoridades públicas.
A
internet garante um plataforma que facilita a liberdade de expressão, mas
encarar essa liberdade de cara limpa e de forma não anônima gera um custo que,
para muita gente que tombou pelo caminho, se mostrou alto demais.
Lembro
de uma história que circulou no início deste ano. Por criticar autoridades
religiosas, o blogueiro Raif Badawi foi condenado a dez anos de prisão e a 50
chibatadas por semana durante 20 semanas no ultraconservador reino da Arábia
Saudita. Depois de ter levado as primeiras 50, estavam esperando suas costas
cicatrizarem-se para mais 50. Isso fez com que o país se tornasse alvo de
críticas internacionais.
Você
pode dizer que aqui não é a Arábia Saudita. Será que não? Considerando que
parte das mortes de blogueiros tem como suspeitos autoridades públicas que eles
denunciavam, qual a diferença? Na prática, é um discussão semelhante à questão
da tortura: é proibida por lei, mas quem se importa?
Nós,
jornalistas, preenchemos tão bem o papel de gado para abate que não conseguimos
nos mobilizar em quase nenhuma circunstância. Será que realmente nos
consideramos melhores do que os outros trabalhadores? Ou, quiçá, nos sentimos
travestidos de alguma estúpida missão, flanando acima do bem e do mal, fazendo
de conta que não é com a gente? Ou decidimos que blogueiros que não fazem parte
de veículos conhecidos, sejam tradicionais ou alternativos, não produzem jornalismo
e, portanto, não merecem nosso respeito?
Em
outras profissões, teríamos protestos ou uma ação coletiva mais forte para
denunciar o que está acontecendo. Talvez até cruzaríamos os braços. Por aqui,
abaixamos a cabeça e damos graças a Deus que isso não é conosco – assumindo o
mesmo padrão que adotamos quando uma demissão coletiva assola um veículo de
comunicação sem que, antes, patrões e empregados tenham conversado para checar
se essa era mesmo a única saída. Abaixar a cabeça. Feito um avestruz.
Como profissionais
cuja função é cobrar o poder público não conseguem sair desse estado de
catatonia? Não é uma questão de posicionamento político.
Com
exceção das insistentes cobranças da sempre alerta Associação Brasileira de
Jornalismo Investigativo, de alguns sindicatos (nem todos), colegas que são
grilos-falantes em redações e chefes que fazem a diferença, parece que estamos
passando o seguinte recado, no melhor estilo de Nelson Rodrigues: “Perdoa-me
por me sangrar!''
Ao
menos, tenhamos dignidade de relatar à exaustão o que está acontecendo,
acompanhando as investigações e listando responsáveis diretos e indiretos, a
fim de que cada cicatriz deixada nos colegas seja devidamente deduzida do
patrimônio eleitoral dos mandatários que permitem que isso aconteça. Não é
corporativismo, é questão de liberdade de expressão!
Ou a
gente só é corajoso quando é com os outros?
Leonardo Sakamoto/ uol
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