O projeto de lei (PL 4.302/1998) aprovado pela Câmara e que libera a terceirização para todas as atividades das empresas tem alguns pontos que estão deixando profissionais de cabelo em pé. Mas afinal, isso vai significar o fim da CLT?

A ampliação da terceirização – caso seja sancionada, a lei vai permitir que profissionais trabalhem para qualquer empresa sendo contratados por meio de prestadoras de serviço especializadas – vai afetar a vida de muita gente. Mas, advogados consultados por EXAME.com destacam: tudo o que prevê a CLT continua valendo.

No entanto, é também verdade que as relações de trabalho mudam e a lei traz algumas polêmicas. “A terceirização é um tema controverso. Se por um lado pode haver aumento no número de contratações já que haverá redução de custos, essa diminuição vem de algum lado”, diz Vivian Dias, assessora jurídica do escritório Mascaro, sobre uma possível redução na remuneração.

Na opinião de José Carlos Wahle, sócio da área trabalhista do escritório de advocacia Veirano, essa reclamação sobre os salários que podem ficar mais baixos é uma crítica de ordem econômica e não jurídica.


Representatividade sindical
Um ponto efetivamente jurídico que ele destaca é a questão dos sindicatos. Antes, um trabalhador da área de TI de um banco, por exemplo, era representado pelo sindicado dos bancários, ainda que sua função não fosse a de bancário.

Agora, pelo projeto aprovado, o profissional de TI poderá ser vinculado a outro sindicato, caso sua função seja terceirizada. Ele terá que ser representado por um sindicato da área de tecnologia “Pode haver uma reviravolta em termos de representatividade sindical”, diz Wahle.

O efeito direto é a pulverização. “Na prática o que vai acontecer é uma segmentação. Na mesma empresa terão vários grupos representados por diferentes sindicatos”, diz Vivian. Para ela, o ponto negativo é que isso pode enfraquecer as negociações com a perda de união, já que serão vários sindicatos representando grupos menores de pessoas.

Para alguns sindicatos isso vai se refletir em perda de arrecadação, mas por outro lado sindicatos ligados às prestadoras de serviço podem ganhar força, diz Wahle.

“Não é que os trabalhadores vão ficar sem representação”, destaca o advogado. Para ele, a solução estará nos acordos coletivos entre os sindicados e as empresas prestadoras de serviço. “Precarização se resolve com acordo coletivo”, diz.


Pejotização
A falta de restrição à contratação de pessoas como empresas, a chamada pejotização, também é um ponto que tem sido comentado. O projeto não diz nada nem contra nem a favor dessa prática que, na realidade, já acontece”, diz Vivian.

Sobre essa questão, os dois advogados lembram que as regras expostas pela CLT sobre quais as situações que criam vínculo empregatício continuam valendo. Ou seja, ser contratado como Pessoa Jurídica (PJ) mas ter que cumprir horário fixo, ser subordinado a um chefe, cumprir ordens dele e receber um salário por isso continuará sendo ilegal. Para a CLT. não existe empregado PJ


Fiscalização de recolhimento de FGTS e INSS
Também polêmica é a mudança no projeto original, que é 1998, e que retirou a obrigação de que a empresa que recorre a uma prestadora de serviços fiscalize o recolhimento de FGTS e INSS dos funcionários terceirizados.

Segundo, Vivian é uma garantia a menos para o terceirizado mas, a empresa que contrata a prestadora de serviços continuará tendo obrigação de pagar direitos trabalhistas aos terceirizados caso a empresa que o contratou não dê conta de pagar.

O que acontece é que ela só pode ser acionada depois de esgotarem todos os recursos voltados à empregadora direta do funcionário terceirizado, o que leva mais tempo. “Isso significa que o trabalhador terá mais trabalho, se recorrer a uma ação judicial, para receber o dinheiro”, diz Vivian.

Na opinião de Wahle, a previsão de fiscalização criava uma burocracia maior e ainda esbarrava na questão da privacidade de dados. “Como a empresa vai transferir comprovantes de recolhimento contendo dados pessoais dos seus empregados para outra empresa”, diz.

Ele também afirma que caso houvesse essa obrigação, o governo estaria transferindo a sua responsabilidade. “Seria o governo terceirizando a fiscalização”, diz ele, lembrando que a tecnologia hoje facilitou ao governo garantir que as empresas estejam cumprindo a lei trabalhista, cruzando dados. Poderia fazer sentido em 1998, segundo ele, mas não em 2017. “É um artigo que o tempo tornou anacrônico”, diz ele.

Por Camila Pati
Fonte: Exame