Por Antonio Noberto,
São Luís nasceu como a
capital da sonhada França Equinocial, empreendimento francês no norte do Brasil
que objetivava colonizar um terço ou metade do território brasileiro atual,
sendo do Ceará ao Amazonas.
O ousado projeto colonizatório junto à Linha Equinocial
(a Linha do Equador) contava com a simpatia e incentivo de ninguém menos que o
rei protestante Henrique IV de Navarra, o chefe da dinastia dos huguenotes, que
só assumiu o trono francês após abjurar o protestantismo e se declarar
católico, ocasião em que proferiu a famosa frase “Paris vale mais uma missa”
(Paris vaut bien une messe).
O casamento com a católica Margarida de Valois foi
o primeiro passo para se tornar um dos reis mais amados e reconhecidos de toda
a Europa. A conversão ao catolicismo se mostrou, na verdade, uma estratégia
política de sucesso para conquista e manutenção do poder, pois o coração e as
ações do “Rei bom” continuavam no propósito de pacificar a França e valorizar o
poder huguenote.
Vendo o Massacre dos seus
aliados protestantes da Noite de São Bartolomeu, ocorrido no dia 24 de agosto
de 1572 por ocasião do Seu casamento com a católica Margarida de Valois,
Henrique IV se empenhou em pacificar o reino gaulês, carcomido pelas guerras de
religião que traziam morte e impediam o progresso da França.
Foi esse Rei protestante, de
vida simples – que quando nasceu, mesmo de origem nobre, tinha como berço um
casco de tartaruga gigante –, que publicou em 1598 o Édito de Nantes, que
definiu os direitos dos protestantes e, com isto, restaurou a paz interna na
França. Pacificado reino, restava a missão de expandir e conquistar. Foi com
esse intuito que Ele, em 1609, enviou o fidalgo huguenote Daniel de la Touche
de la Ravardière para fazer os levantamentos para o estabelecimento de uma Nova
França nas terras do Brasil, com sede na Upaon-Açu, que significa Ilha Grande,
na língua tupi. Um ano antes, La Touche foi procurado pelo seu amigo e vizinho,
o navegador Charles Des Vaux, que já habitava o Maranhão desde o final dos anos
mil e quinhentos.
Des Vaux fez a propaganda das férteis e abandonadas terras
brasileiras, já conhecida em parte por La Touche. Este procurou o seu padrinho,
confessor e papa dos huguenotes, Felipe Duplessis Mornay, governador de Saumur,
que era amigo e conselheiro do rei Henrique de Navarra. Assim, estava feita a
propaganda da parte norte do Brasil. Em 1609, o Monarca, sem perda de tempo,
enviou Daniel de La Touche para os preparativos de uma colônia naquelas terras,
com predominância de protestantes huguenotes. Ao voltar para a França em 1610,
La Touche foi surpreendido com a triste notícia do assassinato do seu rei, que
tombou sob o punhal do fanático católico François de Ravaillac.
O regicídio
representou o adiamento e modificações dos propósitos de Daniel de la Touche de
La Ravardière, que convidou católicos de peso para a concretização do sonho do
Rei morto. Mesmo com toda a insistência da Espanha em querer prejudicar o
projeto, a expedição foi realizada com sucesso. E mesmo sendo vencida pouco
tempo depois pelas armas ibéricas, até hoje é considerada como uma empreitada
vitoriosa, por ter sido um ajuntamento de gente com bons propósitos de
evangelizar e construir uma colônia fundada na paz e no respeito mútuo.
Outro
mérito foi conseguir reunir em um mesmo espaço católicos, protestantes e
tupinambás, todos sob as ordens da flor-de-lis francesa. Uma conhecida frase do
escritor, especialista em História do Brasil e conservador da Biblioteca Santa
Genoveva, em Paris, Ferdinand Denis (1798 – 1890), resume bem a convivência na
França Equinocial: “Não existiu naquele século (XVII) uma relação mais leal e
desinteressada entre católicos e protestantes”.
É por isso que, decorridos
mais de quatro séculos do assassinato de Henrique IV, ocorrido no dia 14 de
maio de 1610, a popularidade dele continua intacta. Ele foi o rei da paz e da
reconciliação da França e quem lançou a semente para uma das maiores e mais
belas cidades do Brasil, que é a capital do Maranhão, que conserva o nome do
seu filho, Luís XIII (1601 - 1643) e do rei Santo, Luís IX (1214 – 1270).
Uma parte desta história
está à disposição do público na Casa Huguenote Daniel de la Touche e na
Exposição França Equinocial, em cartaz no Forte de Santo Antonio, na Ponta da
Areia em São Luís.
Este texto é uma homenagem a
todos os maranhenses, brasileiros e franceses, especialmente ao público
evangélico e simpatizantes.
Viva Henrique IV, viva
Daniel de la Touche e Viva São Luís!
Antonio Noberto.
Escritor, curador da
Exposição França Equinocial, membro da Academia de Letras de São Luís e do
Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão
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