Poucos momentos na história republicana brasileira mostram-se
tão emblemáticos quanto os ora vividos. A representatividade popular
encontra-se vulnerada e a legitimidade dos eleitos, talvez, nunca tenha sido
tão questionada. Governantes desgastados, os eleitos distanciados dos
eleitores, escândalos, corrupção em diversos níveis, influentes lideranças
partidárias presas ou ameaçadas de prisão, quase todos os políticos respondendo
a diversas ações judiciais, enfim, a política quase toda criminalizada – são algumas
das facetas desta grave crise.
Todos os que se aventuram na atividade político-partidária,
notadamente os candidatos, não estão imunes à crise. A política se tornou uma
atividade de alto risco. Exige-se muito dos candidatos aos cargos municipais:
que conheçam os problemas locais, que tenham trânsito com os governos, que
saibam comunicar-se, que atendam aos eleitores em tudo que precisarem, sempre
com simpatia e gentileza, e que ainda estejam dispostos a comprometer o seu
patrimônio pessoal, profissional e financeiro nesta difícil e incerta
empreitada. E isso tudo para o exercício, se vitorioso, de um mandato
temporário, com riscos permanentes de seu encurtamento, sendo que das suas
ações, omissões, opções ou mesmo nada disso, resultarão em processos que
perdurarão por muitos anos. Afinal, diz-se que se é prefeito por quatro anos e
ex-prefeito pelo resto da vida! Quem se atreve?
Depois de eleito, a responsabilidade só se multiplica:
implementar políticas públicas que atendam à uma sociedade heterogênea, potencializar
os parcos recursos, lidar com corporativismos dos mais variados, ser eficiente
e econômico, prezar sempre pela probidade, não desviar e jamais permitir
desvios ou favorecimentos indevidos, ter capacidade de comando e saber escolher
aqueles com quem dividirá a gestão são alguns dos atributos indispensáveis,
embora insuficientes. E, muitas vezes, nem se sabe se está fazendo isso correto
ou não!
E ainda se exige mais: que o eleito disponha de personalidade
apta a lidar com as mais ferrenhas críticas, cobranças e acusações, com os mais
variados questionamentos, julgamentos antecipados, preconceitos e as constantes
ameaças de processos, afastamentos e prisões; não se sabendo, muitas vezes, nem
o porquê da suspeita, da investigação, do processo e de outras ações dos órgãos
acusadores, em sua maioria sigilosas, e sem que o advogado tenha sequer acesso
ao seu inteiro teor ou possa rebater na mesma proporção.
Enfim, a atividade política-eleitoral, talvez mais do que nunca,
está a exigir grandes sacrifícios daqueles que almejam um cargo público. E
diante dessas dificuldades, dentre outras necessidades, o conhecimento das
normas que regulamentam as eleições se torna imprescindível para uma boa
campanha, evitando deslizes que podem implicar em impugnações, processos,
multas e até mesmo em cassação do mandato. A preocupação com a arrecadação e os
gastos das campanhas está no centro das normas que regulamentam as Eleições
2016, como que buscando inibir o que seria o germe propulsor da corrupção no
país. Mas, obliquamente, ao tempo em que se estabelecem regras e mais rígidas,
robustece-se a preponderância do Judiciário e do Ministério Público no processo
eleitoral e na política de forma geral.
Por mais emblemática que seja a conjuntura atual, não existe
saída adequada fora do regime democrático. Por mais questionados que estejam
nossos representantes, o voto popular, direto, universal e secreto continua
sendo a ferramenta mais legítima de outorga de poder. O povo é o titular do
poder, que o exerce através de seus representantes, com duração de mandatos
previamente definidos e competências repartidas, sempre com a opção de
destituí-los ou não. Devemos aprimorar os mecanismos de depuração dos
candidatos e de responsabilização dos eleitos, mas não podemos criar tantos
obstáculos que afastem os bons da política, como – ao contrário do que se
esperava – parece estar ocorrendo.
Melhor do que qualquer
ditadura é a alternância de poder; melhor do que os burocratas é o exercício do
governo por aqueles escolhidos pela população. Isto é uma conquista da nossa
civilização e não podemos retroceder. E devemos conhecer o direito eleitoral
para que o processo de escolha dos nossos representantes ocorra sempre com
respeito às regras, com igualdade de oportunidades, transparência e lisura. E,
para não macular a legitimidade dos pleitos eleitorais, devemos exercitar os
mecanismos de combate aos abusos políticos e econômicos e às condutas
irregulares.
Carlos Sérgio de Carvalho Barros
Advogado especialista em Direito Eleitoral
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